Maribel Alonso: existe talento; é preciso planejar estrategicamente

Um planejamento correto e estratégico é fundamental para alcançar as metas do adestramento, esporte que a “barra sobe” a cada ano. Do Pan-Americano em big tour ao novo porcentual do MER, a juíza mexicana de adestramento (FEI L4/5*) e presidente do Comitê de Adestramento da Federação Equestre Internacional, Maribel Alonso, traçou um panorama da modalidade e avaliou o que julgou no último concurso internacional no País dentro do processo que selecionará os conjuntos que integrarão a equipe brasileira nos Jogos Pan-Americanos de Santiago, no Chile.

Maribel Alonso foi eleita presidente do Comitê de Adestramento da Federação Equestre Internacional para um mandato até 2025 na Assembleia Geral de 2021, realizada na Bélgica. No sábado (19/08) e, portanto, após ter julgado as provas de prêmio São Jorge, intermediária 1, grande prêmio e GPS no CDI no Clube Hípico de Santo Amaro, Alonso concedeu sua segunda entrevista exclusiva ao Adestramento Brasil. A primeira conversa ocorreu no Peru, antes de ter início o Pan de Lima, do qual ela era delegada técnica para adestramento. Confira a entrevista completa abaixo:

Adestramento Brasil — É um prazer entrevistá-la novamente depois do Pan-Americano de Lima. Estamos no último CDI no Brasil para fazer a seleção da equipe e gostaria de começar esta entrevista perguntando sobre suas impressões, o que você achou dos conjuntos no geral.
Maribel Alonso —
O Brasil tem, como sempre, muitos cavalos, recursos, lugares, clubes; tem uma infraestrutura importante. Creio que todos continuamos — o mundo continua — pagando as contas da Covid-19, que nos atrasou muito, nos colocou numa situação em que paramos muitas coisas e é difícil retomá-las. Mas acho que há interesse, os conjuntos estão aí e agora o que eles têm que fazer é começar a polir tudo aquilo que acabam não fazendo quando montam todos os dias em casa, sozinhos. Daí, quando chega ao CDI, querem conseguir fazer tudo em muito pouco tempo. Mas vejo que houve uma diferença e uma melhora importante de ontem [sexta, 18/08] para hoje [sábado, 19/08] dos conjuntos e, sobretudo, do vencedor de hoje, Manuel, na relação do primeiro para o segundo dia.

Nota da redação: Manuel Tavares de Almeida Neto, montando Rosa Belle, fez 65,630% como nota final e 65,435% com Maribel Alonso, ficando em terceiro no grande prêmio. No GPS, o conjunto foi o último a entrar em pista e, ao somar 68,447% de final (69,468% com Maribel), desbancou Paulo César dos Santos que liderava, até então, com Fidel da Sasa JE (68,426%).

Para a prova de grande prêmio, ficamos na expectativa de algum conjunto obter índice para compor MER para Paris 2024, mas não veio. O que ainda falta aos conjuntos de grande prêmio?
Falta mais trabalho dentro da pista, sentir a competição e poder aplicar o que você não conseguiu fazer um dia e tem que tentar no dia seguinte. E fazer com um pouco mais de calma, sabendo que dentro de uma ou duas semanas você não vai conseguir o que ainda não conseguiu [antes], porque isso é um trabalho diário. Você tem que estar muito seguro em casa para saber que, se algo der errado aqui [na competição], você ainda tem recursos para conseguir.

Você foi a delegada-chefe do último Pan-Americano, então, tiro uma dúvida: para valer vaga para Paris 2024, tem de ter dois conjuntos de big tour e os dois têm de terminar?
Para a medalha por equipe você precisa dos dois resultados — do primeiro e do segundo dia, ok? Para os MERs da FEI, eles precisam do resultado do primeiro dia [grande prêmio]. Eu acho que, se o Brasil consegue levar três conjuntos de grande prêmio, ainda que leve um de small tour, teria uma possibilidade maior, mais certa, mais segura e com mais amplitude.

Você julgou seletivas nos outros países da região? Como está o nível dos conjuntos estão?
Não tive a oportunidade de julgar neste ano, porque, com a minha nova posição na FEI, tenho muitas reuniões, coisas administrativas. Julguei na Europa, mas não tive a oportunidade de julgar nos países latinos.

A qualidade dos conjuntos nos países latinos em comparação com o que se vê na Europa ainda está muito aquém?
Creio que a cada dia há melhores conjuntos. E o Brasil tem uma grande vantagem, que é que muitos de seus ginetes viajam mais do que os de outros países, que não se movem muito de seu país, eles permanecem muito locais por questões seja de vida, de trabalho. Mas o Brasil tem interesse e possibilidade de sair e também há projetos para sair.

Sobre seu novo cargo na FEI, de presidente do Comitê de Dressage, o que está achando até agora?
É um posto distinto, que vai além de administrativo, é um cargo consultivo, de assessoria geral sobre regras, sobre mudanças, sobre campeonatos, educação e promoção. É uma outra visão, totalmente diferente, do esporte.

Falando sobre mudança, há a discussão de que os próximos Jogos Pan-Americanos sejam big tour. Isso vai acontecer?
Temos que fazê-lo. Creio que já não será mais uma opção. O próximo Pan-Americano terá que ser sim ou sim em grande prêmio. Poderíamos deixar o small tour para algum país que queira ir, mas a verdade é que é um pouco difícil comparar peras e maçãs.

Para mim, não me parece justo com os outros países que aqui a seleção para olimpíada seja mista e em outros continentes não.
No final, nos vão nos dizer: por que temos um benefício que eles não têm? E eles vão ter razão.

E o Sul-Americano ficaria misto?
Ou talvez seria o momento de ter também small tour, mas mais big tour, porque a gente, no fim, cresce “na punição”. Se temos que saltar 1,60 m em obstáculos, as pessoas saltam 1,60. Se falam que é 1,50 m, saltam 1,50 m. Temos que superar a barreira psicológica que estamos mantendo, porque nos demos conta que há muitos países que antes pensavam que big tour estava muito longe e hoje já o tentaram.

A criação melhorou também…
Sim, muitíssimo e no geral. Haverá mais países se apresentando neste Pan-Americano com algum cavalo que de big tour que antes ninguém pensava que chegaria.

Avaliando as notas entre o Pan de Lima e o que temos agora, me parece também que os porcentuais finais subiram.
Sim, aumentaram.

Em junho, entrevistei a juíza FEI L4/5* Anne Gribbons quando ela esteve aqui julgando CDI e ela me contou da uma vontade que existe de subir o nível geral para fazer eliminatórias para as Olimpíadas no continente, sem ter que ir para a Europa.
Se não temos o nível no Pan-Americano, depois temos de pegar os cavalos e levá-los à Europa, o que é muito mais custoso. Então, é preferível pegar este dinheiro e investir antes, na preparação, que depois do Pan-Americano. Acho que, quando você chega ao Pan-Americano, já tem de ter os MERs.

O MER subiu para 67%. Esta diferença impôs mais dificuldade aos países?
Poderia ser, mas, acho que, basicamente, se pensamos em fazer um 67% para os Jogos Olímpicos é um parâmetro que temos de ter e creio que podemos seguir. Existe talento, há capacidade, existe desejo, existe inteligência, então, tem que fazer um planejamento correto e estratégico.

Foto: Roberta Prescott/Adestramento Brasil


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